segunda-feira, novembro 21, 2011

Morrer na praia

O sal na boca corta-me os lábios finos e secos. O aroma a maresia é putrefacto e enoja-me. A areia, ao vento, toma rumos de nortada e corta-me a face como navalhas afiadas, como picos de rosas secas. No corpo não tenho roupas, nas mãos não tenho anéis. Numa poça de água vejo-me e não sou nada. Pequena. Desprovida. Despida. As ondas batem lá ao fundo, cinzentas e revoltas. Gaivotas emitem ruídos como gritos, passeiam junto à areia em busca de alimento. E eu arrasto-me. Sem forças. Sem pernas nem mãos. Sem ser ninguém, rebolo na areia molhada. Os grãos são muitos e penetram as entranhas, envolvem os cabelos molhados e suados. Cansados. E são tantos e tão pegajosos que não descolam. Não secam nem molham. Tapam-me as pálpebras, as narinas e a boca e impedem-me de respirar. Ao longe, as aves que até agora passeavam junto ao espraiar das ondasm fazem-se ouvir cada vez menos, cada vez menos, cada vez menos. As ondas morrem lá ao fundo, onde não há céu, não há mar nem praia. E o vento é cada vez menos forte. Os olhos já não abrem e o coração quase nem bate. Aos poucos deixo-me ir sem resistir. De nada vale.