sábado, outubro 28, 2006

Abriram-se as portas

A vida dá-nos, por vezes, sinais tão claros daquilo que podemos esperar dela, daquilo que precisamos para continuar a caminhar e daquilo que nos é imprescindível para não desistir...
Nos mais ténues pormenores somos chamados à atenção para a necessidade de não cair, com o risco de não termos quem nos estenda a mão e nos ajude a erguer...
Não que eles não estejam lá, mas porque nem sempre estão na mó de cima e com forças para aguentar com o nosso peso numa só das suas mãos.
Sim, por vezes o mundo desaba nas nossas costas. Por vezes a vida perde todo o sentido e sentimo-nos sós. Por vezes a voz dos outros não é suficiente para afagar a nossa mágoa e a dor é tão forte que se torna inexplicável, e tão fina que nos quer sufocar.
Mas é sempre verdade que um dia o sol tornará a brilhar.
E é sempre exacto que a vida nos oferece pingos de felicidade e toques de magia para nos fazer acreditar.
Ontem, quando à semelhança de todas a sextas-feiras, corria em direcção ao meu lar doce lar, tão desejado como nunca e que se reveste sempre de maior encanto quando se torna próximo, sabia que todos os minutos eram sagrados e nenhum podia ser desperdiçado.
Pus o pé fora do comboio que me trouxe de Braga e apenas cinco metros me separavam da última etapa que me faltava percorrer. Arrastei todo o peso que carregava, para além daquele que trazia nas costas, e quando, enfim, me aproximo, as portas fecharam-se e o outro comboio preparava-se para partir.
«Não acredito... Isto só a mim...»
Mas alguém lá em cima deve ter tido dó e pensado que ninguém merece tanta dor numa semana só. A espera de mais 15 minutos seria a última gota, perderia toda a força de regressar que agora se começava a esmorecer.
Preparava-me para virar costas e descer as escadas, mais uma vez com aquela mala penosa como a minha semana a arrastar-se atrás de mim quando, de repente, quando já não acreditava em nada... As portas abriram-se para eu entrar...
Foi um momento simples para tanta gente, provavelmente stressante para os restantes tripulantes do comboio que tinham horários para cumprir. Mas para mim, aquele segundo foi eterno.
Quando tudo me parecia impossível, as portas abriram-se só para mim e fizeram-me acreditar que quando se crê com muita força, o mundo dá-nos sempre um sinal e faz-nos esquecer a dor passada que a vida muitas vezes nos dá.

domingo, outubro 22, 2006

Cara Nova


Porque às vezes nos cansamos de quem somos e da imagem que reflectimos no espelho e nem sempre somos capazes de ser diferentes, o Sonata ao Luar decidiu mudar a cara com que todos o vêem.
Espero que apreciem, caros leitores, e que o continuem a presentear com as vossas humildes, mas sempre queridas visitas.
Um grande bem-hajam.

quarta-feira, outubro 18, 2006

Dias tristes

Há dias em que a chuva que bate na vidraça e te molha os pés, se torna tão fria e fina que penetra também o teu coração.
Então o teu céu torna-se escuro, as nuvens movem-se na imensidão do tempo e o sol foge com medo de ti.
Nesses dias, tudo tem medo de ti. Até tu própria. Medo se seres quem és, medo de veres quem és, medo do que possas fazer e medo do que possas ser.
Nesses dias escuros, quando tens medo e queres chorar, quando queres fugir e regressar, quando queres um guarda-chuva para te abrigar, apenas te restas tu.
Olha que maçada! Mas tu estás com medo. O dia é escuro e tu temes o breu.
Se a tua mãe cá estivesse acendiamos uma vela e contavamos histórias dos velhos tempos, quando a luz não passava nas correntes da tua humilde terra. Ou então jogavamos ao STOP, em volta da lareira da sala, que aquece sempre tudo: a casa, a família, o coração.
Bolas... Há dias em que chove, em que tens medo, em que não há luz e em que não tens lareira.
Esses sim, são os dias mais tristes.

domingo, outubro 08, 2006

Ignorem-me


3, 2, 1.. Acção!
Olá... Eu sou...
As palavras fogem pelas cordas vocais vibrantes. A voz desfaz-se numa rouquidão muda. A inquietação sobe e transmite ao corpo um suor frio e seco que as mãos não conseguem enxugar. Escorregam as sílabas e perdem-se na imensidão de pensamentos que se focam unicamente no ponto vermelho que pisca agora e me quer ofuscar.
Já devia ter começado a falar. Todos me olham mas não os consigo ver. Todos me escutam mas esqueci a tonalidade da minha voz.
Olho em volta sem descolar o olhar e sinto-me só, impotente, insegura.
Neste momento, tudo o que é certo deixa de o ser, tudo o que é seguro começa a desaparecer e somos nós e ela, que perscruta o nosso movimento mais simples.
Não penso que ninguém viu, penso que ninguém deixou de o ver porque hoje eu estou no centro. Mas ai como odeio ser o centro, ai como queria recolher-me na insignificância da minha criatura, escorregar pela liquidez do chão que me quer fugir por debaixo dos pés.
Foge. E a minha vontade é de o perseguir, de perfurar a objectiva e desaparecer. Num além infinito onde possa, enfim, criar para o mundo, mas sem que me vejam...não me agradeçam, não me digam nada, não me façam nada. deixem-me ser quem sou, transparente e fantasma, passem por entre mim e simplesmente...
Ignorem-me.