Sinto que o que tinhamos começou a perder-se ao longo do tempo, como as folhas das árvores que caem lentamente no Outono e se espalham, por fim no chão.
Há um fio de vento que ninguém sabe de onde vem, porque ninguém o sente senão eu. Nem tu.
Penso que alguém o soprou só para mim, que todas as portas se fecharam e apenas uma janela ficou aberta para fazer a corrente de ar subir e atingir-me as costas, perfurar-me os pulmões cansados e atingir-me como um punhal.
Um punhal que fura mas que não mata. Que corrói mas que não faz sangrar. Que não se sente mas que atinge, magoa e me faz suspirar as folhas caídas no chão.
"Antes que venha o Inverno e disperse ao vento essas folhas [...] que por aí caíram, vamos escolher uma ou outra que valha a pena conservar, ainda que não seja senão para memória", dizia o Garret nas "Folhas Caídas".
Folhas de árvore, longe das folhas de papel. Que não rasgam e que às vezes são verdes ou castanhas. Mas são sempre leves, sempre soltas e livres.
Olho para o chão e apenas vejo pedaços folhas castanhas. Mortas. Ou estarão simplesmente a dormir? São folhas, caídas, adormecidas no chão.
Será que ainda vamos a tempo de as apanhar e colar nos ramos vazios?
Ou será no meu coração?